Ao acordar, deparei-me com um lençol branco que me permitia vislumbrar somente o seu vulto sentado na berma do colchão. Distinguia perfeitamente as linhas que a desenhavam a ela, e à Bruce Vega. Afastei discretamente o lençol para observar as suas costas com todos os pormenores que mereciam ser retidos, expostos à parca luz que atravessava as cortinas na sua direcção, e deixei escapar um sorriso, satisfeito por descobrir a química que a ligava à minha guitarra.
A dado momento, cruzou as pernas, inclinou-se para a frente e começou a dedilhar as cordas. Movia suavemente o braço esquerdo enquanto marcava os acordes e balançava a cabeça e o tronco ao som do ritmo por si imposto, compondo uma melodia que me transmitia uma indeterminada familiaridade.
Relaxado, tentava identificar a música, mas só o consegui fazer após ouvir, da sua boca, o primeiro verso. Ser brindado com Radiohead suavizava todo o meu processo de despertar. Saía de um sonho e entrava noutro, em perfeita harmonia.
A sua voz suspendia perfeitamente no ar, levada pelas ondas que me envolviam cada vez mais.
The bottom of the sea
Your eyes
They turn me
Why should I stay?
A sua voz parecia-me mais bela a cada palavra cantada, nesta versão tão dela e tão pouco de Thom Yorke. Enquanto a música prosseguia, os meus olhos habituavam-se à diminuta iluminação e eu já conseguia distinguir os traços do seu corpo com maior nitidez.
Follow where you lead
Your eyes
They turn me
Eu seria realmente louco ao não seguir os trilhos atrás de si e ela mostrava-me isso agora, com uns acordes simples e uma voz segura.
«Não sabia que tocavas tão bem», disse-lhe.